segunda-feira, 18 de julho de 2011

Ocre ou A fruta mordida

Eu havia deitado na cama e esperava ele se aproximar. Era gostoso, esse intervalo da espera, eu ouvia a água do chuveiro batendo nas paredes do box, nos ladrilhos do chão.

Mal sabia o que esperava por ele naquela cama meio malcheirosa, fato que era peculiar a todo o quarto e pensando bem, a todo aquele motel barato. Um cheiro ocre. Nenhum casal escolhia o lugar pelo bom gosto ou discrição, mas pela necessidade. Era barato, era rapidamente acessível a quem trabalhava na cidade e tinha um quê de excitante aquele aspecto de local que pode ser invadido pela polícia, pelo juizado de menores, pelas associações dos bons costumes, por todas as mães de família da cidade protestando - todos juntos, uma só voz - contra aquele antro no coração da capital.

Enquanto ele estava no banheiro, tirei o vestido, soltei o cabelo e me deitei de bruços apenas com a calcinha de algodão. Queria ver como ele ia sair do banheiro e, sobretudo, queria olhar aquele caralho e guardar na memória. Porque eu tenho essa mania, essa coisa do caralho, de lembrar, fazer comparações mentais e apreciá-los quando aparecem de boa vontade. Não tive dúvidas da boa vontade daquele sacana quando apareceu, recém-saído da ducha.

Ele sorria, ainda que aparentasse certa insegurança com a situação. A primeira vez comigo? A primeira vez com outra? Ele havia saído de um relacionamento, o fato era mencionado com alguma constância nas conversas que ocorreram, assim como sua preferência por comida mineira, a admiração pelo pai, a torcida pelo Sport Club do Recife, o voto em Lula nas eleições de 89 movido por um amor frustrado. O que nunca havia sido mencionado era um autêntico dragão tatuado no braço, que fiz mister de elogiar.

(Devo abrir aqui um parêntese. "Menino do Rio" periga ser a minha música preferida. Quando eu era criança, o pai era vivo e adorava passar as tardes de domingo fumando maconha e ouvindo Caetano. Na época minha mãe dizia que não era maconha, era um cigarro de palha e pedia pra eu não falar na escola e nem na rua. Quando adolescente, descobri que era maconha mesmo. O pai já havia morrido, baleado num assalto, nunca prenderam o ladrão. Ele sempre parecia feliz quando tocava "Menino do Rio", os olhos fechados, os pés bailando no ar. Tem dias que até choro de ouvir.)

Ele riu do elogio, um riso menos frouxo e mais homem. Tinha feito o desenho havia anos, de vez em quando esquecia que o carregava no braço e se surpreendia de vê-lo nos espelhos. Ele já olhava pra minha bunda naquela conversa jogada fora da tatuagem. Ai, o caralho ganhando vida, engrossando. Ele veio pra cama e continuei ali, de bruços, mas fechei os olhos. Uma das mãos pousou aberta bem no meio das minhas costas e foi acariciando até a bunda e então ele estava de joelhos, atrás de mim e a outra mão se juntou na tarefa de tirar a calcinha.

O sacana se inclinou e perguntou, o caralho certamente pronto para a resposta roçando nas nádegas, se eu queria que ele me chupasse o cu. Pergunta terminada, depositou um beijo quase invisível no lóbulo auricular. Se eu quisesse fazer qualquer objeção o beijo desmanchou a intenção de modo covarde. Pude sentir as mãos se apegarem com gosto nas ancas e o bafo dele cada vez mais próximo. Veio então algo que parecia cócegas, um leve choque elétrico, molhado, arenoso. Veio a minha voz também, sem que eu soubesse muito bem o que dizia.

Ele percebeu que agradou praticamente no ato. Talvez fosse uma das vantagens de ter lá seus quarenta anos, saber ler o corpo de uma mulher. De algum modo intangível, a respiração dele passou a ditar a minha e logo eu me dei conta de que estava incapaz de abrir os olhos ou de me colocar de pé e fugir dali, por menos que o pensamento fizesse qualquer sentido naquele instante. O único movimento corporal do qual eu parecia realmente capaz, além de respirar, era forçar o meu rêgo na direção daquela língua.

De súbito, ele parou. Eu pensei que ele apenas estava procurando uma posição mais confortável ou retomando por breves instantes o fôlego, mas ele parou e se pôs novamente de joelhos sobre mim. Me olhava dali, transpirando confiança, o sabor da vitória na saliva. Eu sorria, embriagada daquele homem e dizia coisas desconexas. Fui incapaz de resistir ao impulso de oferecer os quadris a ele, as pernas se posicionaram em conjunto com meus braços de modo que me tornei uma mesa para ele se servir.

Ele manejou com carinho a entrada, como se quisesse compartilhar comigo cada milímetro conquistado, cada veia, cada laceração. Um homem que tinha um dragão tatuado no braço que não conhecia há dois meses atrás. Assim que senti a barriga dele alcançar as minha nádegas, me veio a lembrança de uma tia que havia me dito que soube que havia conhecido o amor de sua vida logo que o seu futuro marido a convidou para uma valsa numa festa. Ela achava fantástico que um homem tão bonito houvesse decidido por ela entre tantas mocinhas bem-arrumadas no salão e ainda por cima dançasse tão bem, ela sonhava constantemente com aquela valsa.

Eu sabia que sonharia o resto da vida com aquele caralho.

Um comentário:

Nina disse...

Ah, a imaginação.