A minha Mangueira desfilava tão linda que cheguei a quase chorar de frente para o aparelho televisor, totalmente emudecido de saudades e a quilômetros daquilo. Minha mãe me ligava pra me dizer que o carnaval estava no papo, o samba era lindo, as pessoas na avenida cantavam e choravam, cantavam e sorriam, cantavam e pulavam. Ah, o carnaval.
Eu apenas sorria ao telefone, embasbacado e tal. Em meio ao desfile, a televisão mostrava subcelebridades alcoolizadas, repórteres histéricos, pessoas felizes em estar no meio daquilo que era, sem dúvidas, um grande acontecimento. “O maior espetáculo da Terra”, gostavam de frisar de três em três minutos. Não estavam de todo enganados.
Apareceu então, num relance, Nina. Os mesmo cabelos, um novo sorriso, um novo cara a seu lado, parecia gringo, era ruivo e estava suando em bicas, deveria ser gringo, escocês, irlandês, nórdico, ele era alto, tinha um chapeu de gringo e uma latinha de cerveja na mão. Apareceu por breves instantes no meio da arquibancada e logo se foi, cortaram para uma atriz mostrando seus novos glúteos, muito bonitos por sinal.
Não que eu tenha qualquer coisa contra os glúteos femininos, porque os adoro, especialmente vistos de perto, onde podemos observar detalhes que só o olho humano é capaz de ler: as celulites, eventuais cicatrizes, sinais, a marca da calça jeans que apertou durante o dia, as linhas dos elásticos das calcinhas, a cor. O sujeito precisa ter um trauma muito sério ou estar necessitado de uns pescotapas para ignorar essas pequenas gotas de poesias que cada mulher pode oferecer a olho nu.
Aquele ruivo certamente apreciava os glúteos de Nina, glúteos que um dia me demorei em ninar, sim, Nina e ninar, não foi acidente, foi propósito. Não pretendo relatar o que havia naqueles glúteos porque o gringo devia saber e eu um dia soube, quem mais precisar saber que descubra por conta própria, mas aparentemente ia ter que se ver com o rapagão ali. Nina não era digamos, uma dessas mulheres-bundas, não tinha o abdômem de pugilista nem coxas de lateral esquerdo. Era nisso em que residia sua graça, incluindo aí, seus glúteos.
A Mangueira fez paradinhas infinitas, desfilou seus próprios glúteos, seus próprios sambas, alegorias em profusão que me silenciaram naquela madrugada solitária em meu apartamento. A cada corte, eu torcia para que a televisão acompanhasse meus olhos e se voltasse para Nina, para que eu pudesse saber, se ela era de fato Nina e não uma lembrança que me tomou de assalto movido sei lá por que cargas d’água. Em vão, a Mangueira se foi e logo o público que acompanhava o desfile também e a talvez Nina e seus pares, o gringo e seus glúteos. Se ele fosse um cabra bom, ia passar o braço em torno daquela cintura e pousar a mão matreira sobre um deles, um carinho, um agradecimento, uma promessa.
O tempo pode ser algo muito feio se não tivermos sorte ou talento. Ele corroi, ele abrasa, ele arranca os cabelos, ele nutre de gordura, ele arranca dentes, ele desgasta o viço. Para a minha vista, Nina não havia sofrido o achaque dos anos e continuava a moça que me roubou fôlego e coração. Ou será que o coração também cega a vista quando quer?
Um comentário:
Muito bom esse texto! Misturando paixões, ele me pareceu sensível, ao mesmo tempo que segue a linha do blog!
Pergunta: a Nina voltou? Ou essa é outra Nina?
Hahahahahahaha
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