"Mi casa, su casa, chico".
Subimos as escadas, degrau a degrau, ela sempre à frente. Subia aqueles degraus com algum tipo de método, pois ninguém haveria de caminhar naqueles saltos com tamanha desenvoltura sem treinamento prévio. Devia caminhar escada acima calculando cada passo, para testar minhas reações.
Três andares após a portaria do edifício, ela entrou num corredor e as luzes foram se ligando conforme ela seguia escuridão adentro, até o número 34. Ela me olhou pelo canto daqueles olhos de oceano, eu pendia no corredor feito um bibelô, uma prenda de quermesse. A meia calça arrastão, a saia prendada, a luz da sala.
"Mi casa, su casa, chico". Agora havia um sorriso.
Ela deixou eu entrar e ficar plantado feito garoto em casa de estranhos a olhar pra tudo, entrou em outro cômodo, foi acendendo luzes, ouvi o barulho de saltos sendo deixados no chão de madeira. Então surgiu lá do infinito onde ela estava descalçando os sapatos acordes da guitarra de Jeff Buckley. Ela não tardou muito mais a ressurgir.
Na mão esquerda havia algo que me lembrava sem dúvidas um cigarrilho de maconha. Eu peguei o isqueiro que jazia na mesinha de centro da sala e tomei o artefato de sua mão, para em seguida acender e celebrar a boa nova com uma bela tragada. Ela observou a cena com olhos de lince. A fumaça foi saindo lentamente de minha boca e então os lábios que ela sorria vedaram a fumaça nos meus.
Quando pude voltar a sentir o chão sob meus pés, ela já caminhava, lenta, cheia de quadris, descalça, o cigarro na mão. As omoplatas, a coluna vertebral que dividia aquela mulher ao meio. Ela se recostou na parede e tragou, a fumaça vazando dos dobbermans.
De súbito, aquela fantasia que lhe cobria o corpo escorregou por mãos invisíveis rumo ao chão. A vastidão dos seios diante daquela parede nua, tão branca. Sua mão esticada me oferecia outra tragada.
Apanhei o cigarro.
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